sexta-feira, 16 de dezembro de 2016
quarta-feira, 26 de outubro de 2016
O racismo no Brasil
Observe:
A palavra raça, apesar de ter origem biológica, não tem base
científica para definir, e muito menos classificar, seres humanos.
Apesar disso, a sociedade faz uso da palavra raça com sentido
político, isto é, para definir diferenças entre pessoas.
Para legitimar posições racistas, usa-se uma diferença biológica
(que é superficial, pois não há raças entre os humanos) ou
cultural (religião, modo de se vestir ou falar), justificando
privilégios e exclusão social. O acusador coloca-se como superior
em relação à vítima do racismo.
Ter amigos negros não faz de ninguém menos racista. Ser filho ou
parente de negros também não. O que impede uma pessoa de ser
racista é entender que o racismo é um mal cruel e excludente, que
relega as vítimas à pobreza material e à destruição de seus
valores e de sua cultura.
A relação do racista com a sua vítima está ligada, diretamente,
ao pensamento de dominação de um povo sobre outro, de um indivíduo
sobre o outro. A atitude racista é uma atitude de dominação,
característica dos processos de colonização que empreenderam
diferentes impérios ao longo da história da humanidade. A dominação
dos europeus contra africanos e americanos levou à escravização de
negros e índios que tão bem conhecemos no Brasil.
O preconceito racial segundo Sartre:
A condição do negro está ligada
ao racismo e à miséria. Considerando a população brasileira em
geral, pode-se afirmar que raros são os casos nos quais os negros
superam condição de pobreza ou mesmo de miséria e recebem
notoriedade social.
A miséria causada pelo racismo e
pelas políticas de Estado pós-libertação dos escravos e a
despreocupação das autoridades geraram um contingente de excluídos
ou marginaliza dos, que são reconhecidos pela mesma cor de pele,
cabelo, lábios e cultura de raízes africanas – os negros.
A falta do mínimo necessário para
a vida gerou e gera duas orientações: a revolta e a acomodação. A
revolta pode ser política, isto é, negros e negras se encontram
para discutir o que lhes faz sofrer e cobrar das autoridades a
igualdade. A acomodação pode ser entendida como uma alienação.
Muitos negros e negras simplesmente aceitam o papel que as elites
lhes impuseram durante séculos – a de que eram trabalhadores
braçais em situação precária. Por outro lado, a alienação pode
gerar a vitimização: o indivíduo se vê sempre perseguido e
incapaz de agir, o que resulta em baixa autoestima. Em consequência,
os negros valorizam outras culturas, como a da hegemonia branca
europeia.
Para Sartre, o negro precisa
encontrar a sua “negritude”, que é a maneira dialética, ou a
negação da injustiça, causada pelo capitalismo. A condição negra
de miséria, de humilhação e exclusão social, foi gerada pelo
capitalismo, em processos de escravização de um povo sobre outro
povo. Do ponto de vista cultural, diferentemente do proletário
europeu, formado pelas fábricas, o negro teve um espaço para
desenvolver sua cultura, que só podia ser uma cultura de
resistência. Cada vez que um negro coloca uma roupa que expressa sua
identidade, compõe uma música que fala de sua vida, não tenta
moldar o seu corpo para ser igual aos outros, ele produz a
“negritude”, a resistência cultural dentro do capitalismo racial
e cristão. A negação do ato colonizador. O capitalismo colocou o
burguês e o trabalhador em oposição por meio de uma situação de
exploração. Mas o capitalismo também colocou o branco europeu em
oposição ao negro escravo e ao negro pós-libertação, o que
também resultou em formas de exploração.
O capitalista oprime o trabalhador
enquanto, em certa medida, o trabalhador branco oprime o negro. Por
isso, o negro deve assumir a consciência de que sua raça é
explorada por uma questão social de dominação do homem branco e
não por sua natureza biológica. Em Sartre, há uma diferença entre
o trabalhador branco e o trabalhador negro, pois apesar de ambos
sofrerem as dificuldades da pobreza, o negro sofre como negro, isto
é, além da pobreza, ele encontra a discriminação junto àqueles
que também são pobres e oprimidos, e até os trabalhadores brancos
discriminam o trabalhador negro.
O que é preciso fazer? É preciso
que cada um tome consciência de sua condição; que o trabalhador
tome consciência de sua exploração e perceba que os problemas
advêm de sua posição no mundo capitalista; que o negro identifique
sua condição de submetido pelo racismo. Sob a inspiração de
Sartre, pode-se pensar que a consciência de que é submetido ao
racismo deve favorecer o entendimento por parte dos negros de que é
preciso assumir-se como negro, sem negar origens africanas e história
cultural, mas negando a condição de exclusão e inferioridade de
que foram vítimas. Assim, o negro deve orgulhar-se de sua negritude,
atribuindo significados positivos ao fato de ser negro.
Sartre inspira um pensamento de
valorização do negro. Um olhar negro sobre o mundo. Uma compreensão
de que o negro não pode ser conjugado como o mal. A nossa cultura
associa as palavras negro, negra e preto ou preta a ideias
pejorativas. Por exemplo, o que significam as expressões “mercado
negro”, “o lado negro”, “magia negra”, “a coisa está
preta”?
A ideia de negritude entendida como
valorização do negro e crítica à visão negativa do mesmo impõe
outra opção à ordem da cultura excludente. Sendo chamados de
negros ou afrodescendentes, essas pessoas se encontraram pela
negritude, que significa valorização do negro, da história dos
povos africanos, da cultura negra e de uma nova visão sobre os
negros, bem como sobre a importância de superação da exclusão
social a que foram submetidos. A negritude seria o desenvolvimento da
cultura negra após a colonização. Nela, estaria uma inversão em
oposição ao sistema eurocêntrico capitalista e branco. A negritude
revela o racismo.
A particularidade do racismo no brasil
“Para oprimir e submeter, especialmente, os negros, o racismo no
Brasil não necessitou de regrasformais de discriminação, de
desigualdade e de preconceito racial. O racismo como ideologia
emprega e se alimenta de práticas sutis, de nuances e de
representações que não precisam de um sistema rígido e
formalizado de discriminação. Ao contrário das experiências
norte-americana ou sul-africana que estabeleceram regras claras de
ascendência mínima para definir seus grupos sociais, nas quais, por
exemplo, uma gota de sangue negro era mais que suficiente para
macular a suposta pureza racial dos brancos. As formas de
classificação racial e a eficácia do racismo no Brasil nutriram-se
sempre das formas mais maleáveis, mais flexíveis para atingir suas
vítimas, porém essas sutilezas não deixam de ser igualmente
perversas e nocivas para os indivíduos e coletividades atingidos.
De qualquer forma, essa sutileza, que informa o tipo de racismo
presente no Brasil, segue de mãos dadas com as premissas de
ideológica “democracia racial” que pretende afirmar e defender a
inexistência do racismo, precisamente porque no país não há
posições ou locais sociais que negros não possam ocupar. Não há
cargo, posto de trabalho, lugar, emprego, profissão etc. em que os
negros não possam competir. Todavia, basta uma breve observação na
paisagem social para se verificar que a democracia racial ainda não
chegou para os negros. Eles são minoria nas posições de maior
reconhecimento, nas profissões melhor remuneradas, nos segmentos de
melhor renda etc. Especialmente a mulher negra, que ocupa uma posição
social extremamente desvantajosa quando comparada com o conjunto da
população branca do país. Frequentemente ela exerce atividades de
menor reconhecimento social, menor retorno salarial e de menor
exigência de qualificação.
Para transformar essa situação, tão comum na paisagem social do
Brasil, torna-se necessário a adoção de amplas políticas públicas
que busquem minimizar as brutais desigualdades de renda, escolarida
de, emprego, moradia, saúde etc. que afetam mais diretamente os
negros. O que sugere uma substantiva transformação do desenho e da
execução das políticas formuladas pelo Estado. Transformação que
garanta efetivamente à maioria da população, especialmente aquela
afrodescendente, o acesso aos elementares direitos de cidadania. Por
exemplo, a ampliação das oportunidades de ensino deve vir
acompanhada de mecanismos de manutenção dos estudantes nas
instituições de ensino.Pelo que se disse, reconhecer a existência
e a eficácia da forma de racismo praticada no Brasil significa lutar
para alcançar para a maioria da população brasileira, e para a
população afrodescendente, em especial, o reconhecimento social de
serem sujeitos portadores de direitos e igual dignidade humana.
Reconhecimento que o racismo e a tão decantada, mas jamais
praticada, democracia racial brasileira, insistem, sobretudo, em
negar aos negros brasileiros”.
SIlVA, Jair Batista da. O que é racismo no Brasil. Revista Aulas
(texto no prelo)
Atividade
Observações:
- Não se esqueça de colocar Nome, Número e série;
- Antes de enviar, coloque o código solicitado;
- Observe o término do tempo programado para a atividade.
Com base nas leituras e discussões, responda:
1- Preto ou negro? Qual termo é correto para se referir ao afrodescendente? Aborde na sua resposta o que é racismo
2- Como Sartre compreende o preconceito racial nas sociedades capitalistas?
2- Como Sartre compreende o preconceito racial nas sociedades capitalistas?
3-A análise dos dados estatísticos do IBGE nos permite concluir
que...
4- Compare o preconceito racial praticado no Brasil com o praticado
nos Estados Unidos.
Marcadores:
Preconceito racial Brasil,
Racismo segundo Sartre
terça-feira, 25 de outubro de 2016
Filosofia e Ciência - atividade
Orientação: coloque
Nome: ___________ Número____ e Série________
Na sequência responda as questões na ordem que desejar.
Escolha o perfil anônimo
Responda:
1- Havia separação entre filosofia e ciência na antiguidade? Explique!
2- Na idade média uma ciência se tornou autônoma. Qual foi?
3- Como se deu a separação entre a filosofia e ciência na modernidade? Qual foi o papel de Galileu Galilei nesse contexto?
4- Quais são as diferenças entre os saber filosófico e científico atualmente?
Texto no link
https://docs.google.com/document/d/1LXyikE2-4lf4pufxwN-KnicVrmQGyTJ_jh1xrkmM2o0/pub
Nome: ___________ Número____ e Série________
Na sequência responda as questões na ordem que desejar.
Escolha o perfil anônimo
Responda:
1- Havia separação entre filosofia e ciência na antiguidade? Explique!
2- Na idade média uma ciência se tornou autônoma. Qual foi?
3- Como se deu a separação entre a filosofia e ciência na modernidade? Qual foi o papel de Galileu Galilei nesse contexto?
4- Quais são as diferenças entre os saber filosófico e científico atualmente?
Texto no link
https://docs.google.com/document/d/1LXyikE2-4lf4pufxwN-KnicVrmQGyTJ_jh1xrkmM2o0/pub
segunda-feira, 13 de junho de 2016
Filosofia da Ciência
O que é CIÊNCIA do método às leis científicas.
Comecemos nossa investigação sobre a ciência buscando o significado básico dessa palavra. O termo ciência vem do latim scientia, que significa “conhecimento”. Assim,como ponto de partida, podemos definir a ciência como o campo da atividade humana que se dedica a construção de um conhecimento sistemático e seguro a respeito dos fenômenos do mundo.
Por que dissemos “sistemático e seguro”?
Porque, como vimos antes (no capítulo 4) a palavra conhecimento pode ser usada em um sentido geral ( lato sensu) e em um sentido estrito (stricto sensu), que é o conhecimento sólido e bem fundamentado. trata-se do que os gregos chamavam de episteme, o tipo de conhecimento que interessa à ciência. Por isso, a investigação sobre o conhecimento obtido pela ciência é conhecida como epistemologia.
OBJETIVOS DA CIÊNCIA
Nossa segunda questão pode ser: “conhecer para que?
Um terremoto pode ser previsto através de estudos geológicos. Relações com Tsunamis podem salvar a vida de milhares de pessoas |
Costuma-se dizer que é para tornar o mundo compreensível, proporcionando ao ser humano meios para prever situações e exercer controle sobre a natureza. Essa visão surgiu com a ciência moderna (conforme estudamos no capítulo 13 e veremos adiante mais detalhadamente). SJacob Bronowski (1908-1974), matemático britânico de origem polonesa, pelo conhecimento científico, o “Homem domina a natureza não pela força, mas pela compreensão” (Ciências e valores humanos, P.16).
Será isso possível? Será que a ciência alcança a compreensão que pretende, e o faz sem o uso da força? Essas questões serão analisadas ao longe deste capítulo.
Método científico
Vejamos agora ao meio utilizado pela ciência, desde o início da idade moderna, para alcançar seus objetivo: o método científico.
O que é método científico? O termo método vem do grego meta, “através”, e hodos, “caminho”, significando “através de um caminho”, ou de um procedimento. Assim, método científico é o núcleo de procedimentos que orienta o modo de conduzir uma investigação científica. Há diversos conjuntos de procedimentos que caracterizam diferentes metodologia.
Embora variado, o método científico tem por base de modo geral, uma estrutura lógica que engloba diversas etapas, as quais devem ser percorridas na busca de solução para o problema proposto.
Vejamos um esquema das etapas do método cientifico experimental:
° Enunciado de um problema- observando fatos, o cientista enuncia um problema que o intriga e que ainda não foi explicado pelo conhecimento disponível. Nessa etapa, ele deve expor seu problema com clareza e precisão e procurar os instrumentos possíveis para tentar resolvê-lo;
° Formulação de uma hipótese- Tentando solucionar o problema, o cientista propões uma resposta possível, que constitui uma hipótese a ser avaliada em sua investigação. Isso significa que a hipótese é uma proposta não comprovada, que deve ser testada cientificamente;
° Testes experimentais da hipótese- O cientista testa a validade de sua hipótese, investigando as consequências da solução proposta. Essa investigação deve ser controlada por ele, para que o fator relevante previsto na hipótese seja suficientemente destacado na ocorrência do fato-problema;
° Conclusão- O cientista conclui a pesquisa científica, confirmando ou corrigindo a hipótese formulada e testada.
Outros Ingredientes
Observe, porém que, conforme assinalam alguns estudiosos, os métodos científicos não constituem sempre conjuntos fixos e estereotipados de atos a serem adotados em todos os tipos de pesquisa científica. Eles nascem da percepção de certos procedimentos recorrentes, mas que, por si só, não são suficientes para garantir o êxito de qualquer emprendimento.
Os resultados satisfatórios de uma pesquisa estão sujeitos a um amplo conjunto de fatores, desde a natureza do problema pesquisado até os recursos materiais aplicados na pesquisa. Dependem, ainda, de elementos como o acaso e , sobretudo, na criatividade, imaginação e sagacidade do pesquisador.
Leis e teorias científicas
Além de utilizar um método, os cientistas, depois de suas investigações, também formulam leis e teorias, principalmente dentro das ciências naturais, como destaque para a Física. Na ciências sociais esse modelo de investigação não é tão presente.
Mas o que são exatamente as Leis e teorias científicas?
Analisando inúmeros fatos do mundo, percebemos a ocorrência de fenômenos regulares, como a sucessão do dia e da noite, das estações do ano, o nascimentos do seres vivos, a atração dos corpos em direção ao centro da terra e outros.
Para reconhecermos a ocorrência de regularidades, devemos observar os fenômenos semelhantes e classificá-los segundo suas características comuns.
Ao examinar as regularidades, a ciência procura chegar a uma conclusão geral que possa ser aplicada a todos os fenômenos semelhantes.
Por meio desse processo, formulam-se as leis científicas. Nesse sentido, leis são enunciados generalizadores que procuram apresentar relações constantes e necessárias entre fenômenos regulares.
As leis científicas desempenham duas funções básicas:
° resumem uma grande quantidade de fenômenos regulares, favorecendo uma visão global do seu conjunto;
° possibilitam a previsão de novos fenômenos que se enquadrem na regularidade descrita.
As leis costumam fazer parte de uma teoria científica, que “especifica a causa ou mecanismo subjacente tido como responsável pela regularidade descrita na lei ( Kneller, A ciência como atividade humana, P. 150).
Portanto, a teoria tem como objetivo explicar as regularidades entre os fenômenos e deles fornecer uma compreensão ampla. Costuma-se dizer que explicar e prever constituem a função fundamental das leis e teorias científicas.
Transitoriedade das teorias científicas
A ciência propõe-se atingir reconhecimento precisos, coerentes e abrangentes. Caracteriza-se por tentar, deliberadamente, alcançar resultados que o senso comum, por suas condições, não pode normalmente alcançar.
O estudo da história das ciências revela, no entanto, que inúmeras teorias científicas que, por algum tempo, reinaram como absolutamente sólidas e corretas mais tarde foram refutadas, sendo modificadas ou substituídas por outras.
Por exemplo, durante séculos e séculos, o mundo ocidental acreditou, de forma inabalável, que a terra fosse o centro do universo. Entretanto, Nicolau copérnico, com a obra da revolução das esferas celestes, publicada no ano de sua morte, 1543, demonstrou que a terra se movia em torno do seu próprio eixo e ao redor do Sol. Era a teoria heliocêntrica, que refutava o geocentrismo de Ptolomeu.
Isso significa que os conhecimentos científicos não são inquestionavelmente certo, coerentes e infalíveis para todo o sempre. É como se tivessem certas “condições de validade”.
Essa permanente possibilidade de que uma teoria científica seja revista ou corrigida por outra pode conduzir à noção pessimista de que a ciência fracassou no seu propósito ou perdeu sua razão de ser. Ou, ainda, à posição cética de que todos os reconhecimento científico são crenças passageiras que serão condenadas no futuro.
No entanto, existe certo consenso entre os defensores da ciência a respeito de que, embora as teorias científicas possam ser refutadas, reformuladas ou corrigidas, a ciência cumpre sua função enquanto tem “Êxito no seu propósito de fornecer explicações dignas de confiança, bem fundadas e sistemáticas para numerosos fenômenos” (Nagel, ciência: natureza e objetivo, em Morgem Besser, Filosofia da ciência, P. 18).
Para alguns, seu papel seria justamente o de construir um conhecimento continuamente progressivo.
Filosofia da Ciência
Essas e outras discussões levaram ao surgimento de um campo de reflexão sobre a ciência e seus métodos a epistemologia ou filosofia da Ciência ( aqui usamos as duas expressões como sinônimas, embora seja possivel fazer uma distinção entre elas, como observamos no quadro sinico II, no final da unidade I).
O tema geral da filosofia da ciência é o desenvolvimento da reflexão critica sobre os fundamentos do saber cientifico. Esse tema geral desdobra-se em uma série de questões, tais como:
° Estudo do método de investigação científica;
° Classificação da ciência;
° Natureza das teorias científicas e suas capacidades de explicar a realidade;
° Papel da ciência e sua utilização na sociedade.
A epistemologia destacou-se como ramo da filosofia no final do século XIX, a partir de uma polêmica entre os pensadores ingleses William whewell (1794-1866) e John stuart Mill (1806- 1873) sobre o papel do método indutivo na ciência. ( Voltaremos às reflexões da filosofia da ciência mais adiante neste capitulo.)
Responda:
1- Diferencie a ciência do Senso Comum
2- Explique quais são os objetivos da Ciência a partir da Dengue.
3- Quais são as quatro etapas do método científico?
4- O que são leis e teorias científicas?
A AMÉRICA NÃO FOI DESCOBERTA!
Reflexões sobre “A Conquista da América – A questão do Outro”
de Tzvetan Todorov (Ed. Martins Fontes, 4ªed, 2011)
de Tzvetan Todorov (Ed. Martins Fontes, 4ªed, 2011)
* * * * * *
Uma das primeiras coisas que colocamos
sob suspeita quando começamos a estudar mais a fundo a “Descoberta da
América” é a própria denominação do evento histórico, esta curiosa
expressão que batiza a ocorrência colossal – “descoberta”. Será este o
termo mais adequado? Será que dizer “descobrir” não serve para mascarar e
esconder todos os horrores colossais da guerra de conquista que
empreenderam as potências européias contra o Novo Mundo? Não é este um
eufemismo criado pelo invasor, destinado a ser engolido sem reclamo
pelos cordeirinhos submissos dos colonizados?
Será que dizer que nos
“descobriram” não intenta fazer com que nos esqueçamos de toda a
pilhagem, todo o roubo de recursos naturais, que ocorreu por aqui (todo o
ouro surrupiado de Vila Rica/Ouro Preto, toda a prata saqueada de
Potosí…)? Não querem esconder debaixo de tapetes sírios todo o sangue
índigena que correu sob a espada e as armas estrangeiras? Aonde, dentro
da palavra “descoberta”, estão todas as vidas escravizadas, subjugadas,
maltratatas, coisificadas e massacradas pelos (tsk tsk tsk…)
“descobridores”? Para ficar só no exemplo do México: ora, 24 milhões de
índios mexicanos assassinados merecem algo melhor do que o edulcorado
conto-de-fadas da “Descoberta (idílica e doce) do Eldorado”!
Bastante asséptica e higiênica, a palavra “descoberta” parece remeter a um processo limpo de desvelamento, um mero retirar das cobertas,
algo que traz à luz o que antes estava na escuridão. “Descoberta”,
termo de tonalidade positiva, parece referir-se mais a um ato de
encontrar um território novo – que só é “novo”, é claro, quando
enxergado a partir da perspectiva daqueles que antes o desconheciam, os
europeus que aqui aportaram lá por 1.500.
Só que as terras
“descobertas” não eram desabitadas, e nelas floresciam diversas
sociedades que ali haviam vivido por milênios: como lembra Pierre
Clastres, “a América do Sul é um continente cuja imensa superfície, com
raríssimas exceções (como o deserto do Atacama no extremo norte do
Chile), era inteiramente ocupada pelos homens no momento do
descobrimento da América no final do século XV – ocupação, aliás,
bastante antiga, de cerca de 30 MILÊNIOS, como o atestam os estudos da
pré-história” (CLASTRES, Arqueologia da Violência, p. 91).
De modo que a chegada dos
europeus, longe de poder ser descrita como a chegada a uma terra
virgem, representou muito mais uma invasão estrangeira em um continente
previamente habitado, por milênios, por milhões de seres humanos. A
palavra “descoberta”, predileta dos colonizadores e seus escritores da
História Oficial, não serviria pois para esconder as chagas que se
escondem por trás do impacto catastrófico da conquista européia do Novo
Mundo no que isso acarretou de genocídio e etnocídio, escravização e
racismo, micróbios e epidemias, dentre outros inúmeros males?
Ora, ora! A atitude
recorrente do conquistador europeu é se auto-proclamar “superior”,
“civilizado”, devoto do Deus verdadeiro; ao Outro, este desconhecido,
este estranho, este diferente, lança-se o rótulo fácil de inferior,
bárbaro, idólatra de falsos deuses. O nome disso em ética é “arrogância”
ou “presunção”; em psicologia, “narcisismo”; em antropologia,
“etnocentrismo”. Quão facilmente se tornam tirânicos os que se sentem
arrogantemente “superiores” ao resto, com direito a manter o outro sob
seu jugo! Ou pior: os que se julgam “eleitos”, os “altamente
meritórios”, os “filhos prediletos do Todo-Poderoso”, estes se permitem
os massacres mais inacreditavelmente sangrentos – e tudo por “amor a
Deus” e fidelidade à “boa Causa” (Stirner explica!).
“A guerra contra os
infiéis é justificada, pois abre caminho para a difusão da religião
cristã e facilita o trabalho dos missionários”, diz o espanhol
Sepúlveda, assecla da Coroa Real desejoso de submeter o novo continente
ao Cristianismo, ainda que ele tivesse que ser imposto pela força bruta,
pelos assassinatos em massa, pelo genocídio indígena. É que, conta-nos
também este pio cristão a serviço do Rei, “é legítimo banir o crime
abominável que consiste em comer carne humana” (TODOROV: 2011, pg. 224).
Ora, os espanhóis,
brancos e cristãos, que atravessaram o Atlântico à serviço de Vossa
Majestade o Rei e Vossa Santidade O Papa, eles que faziam pose de
“hiper-civilizados” e desdenhavam os costumes bárbaros dos astecas,
conseguiram, em meio século, somente no México, exterminar mais de 20
milhões de seres humanos. A “descoberta” da América, como Todorov nos
relata, ou seja, a partir de uma perspectiva bem mais interessante e
verídica do que aquela da “história oficial”, foi uma catástrofe
inimaginavelmente trágica para as populações que aqui viviam. O
genocídio perpetrado na América pelos cristãos europeus, embevecidos de
imperialismo evangelizador, superam em número o nosso atual “paradigma
do Mal Absoluto”: o holocausto hitlerista de mais de 6 milhões de
judeus. A sinistra maquinaria de massacre sistemático que os europeus
impuseram aos humanos americanos, segundo Todorov, resume-se assim:
“Em 1500, a população do globo era de
aproximadamente 400 milhões, dos quais 80 milhões habitam as Américas.
Em meados do século XVI, desses 80 milhões… restam 10 milhões. Se nos
restringirmos somente ao México: às vésperas da conquista, sua população
é de aproximadamente 25 milhões; em 1600, é de 1 milhão.” (pg. 191)
Nós, nascidos em épocas
já distanciadas por séculos da invasão das metrópoles absolutistas
européias, esquecemos muito facilmente de fatos como este: entre o Popol
Vuh, livro religioso dos astecas, e a Bíblia, livro-base da civilização
dos conquistadores, a relação é de um livro autóctone e de um livro
estrangeiro. A Bíblia é uma coisa importada, aporte dos invasores,
trazida junto às caravelas dos invasores, massacradores de índios e
escravizadores de negros. Na Inglaterra, outro “centro imperial da
Europa”, destinado a grandes “aventuras” colonizadoras na “Nova
Inglaterra”, mitos também circulavam sobre a vinda da Nova Jerusalém,
sobre a responsabilidade dos cristãos de erguê-la, uma vez que a
Jerusalém “oficial” estava em mãos muçulmanas. A América era vista como
terra “virgem” onde edificar, erigir, monumental e sublime, um
esplendoroso Reino servindo ao Império da Cristandade!
“I will not cease from mental fight
nor shall my sword sleep in my hand
Till we have built Jerusalem
In england’s green and pleasant land.”
nor shall my sword sleep in my hand
Till we have built Jerusalem
In england’s green and pleasant land.”
WILLIAM BLAKE
O fato de muitos desses
assassinos, genocidas e escravocratas se declararem homens de Deus,
homens de fé, servidores da santa causa do cristianismo, deveria nos
bastar para começar – como recomendava Wittgeinstein – a colocar os pontos-de-interrogação bem lá no fundo,
ou seja, abismando-nos na indagação perigosa e herética: o “amor a
Deus”, se pôde gerar tamanha hecatombe e destruição, deve ser
inocentado? A História não seria menos convulsionada por violências
infindas e cabeças rolando caso a arrogância dos eleitos fosse
sobrepujada pela abertura-de-espírito daquele que enxerga a Diferença e a
Alteridade como oportunidade de diálogo, de aprendizado, de
intercâmbio, de mescla? Em outros termos: se a História nos mostra tanto
sangue derramado por puritanos e puristas, crentes em sua própria
superioridade moral e religiosa, não seria mais sadio, mais sábio e mais
feliz aderirmos a uma concepção das relações humanas que privilegiasse
mais a mescla fecunda de diversos vetores e o júbilo de ser impuro?…
II. COLOMBO: QUIXOTE DA VIDA REAL…
A Conquista da América é
filha de “grandes esperanças de lucro” (Cristóvão Colombo, Diário, 1492,
p. 11): “Os mandatários da expedição, os Reis de Espanha, não se teriam
envolvido na empresa se não fosse a promessa de lucro… o ouro era uma
espécie de chamariz para que os reis aceitassem financiá-la” (TODOROV:
p. 11). Mas há mais: a alucinada religiosidade militante de Colombo,
para quem “a expansão do cristianismo é bem mais importante que o ouro”:
numa carta ao Papa, ele diz que sua próxima viagem será “para a glória
da Santíssima Trindade e da santa religião cristã”; “espero em Nosso
Senhor poder propagar seu santo nome e seu Evangelho no Universo” (p.
13).
Nosso aventureiro
idealista, Cristóvão Colombo, era animado por ideais bem mais sublimes
do que somente roubar todo o ouro e as pedras preciosas que encontrasse
pelo caminho, enfiando todas as riquezas em caravelas destinadas à
Espanha. Colombo, conforme a brilhante descrição de Todorov, também
tinha a “ambição espiritual”, que ele mesmo deveria considerar pia e
sublime, de ali espalhar a “doutrina sagrada” do Deus único,
representado pelo Papa romano, ungidor dos Reis de Castela, e que exige
(Deus furibundo e exclusivista…) a submissão da Terra toda à Cruz. Como
sintetiza Todorov,
“A vitória universal do
cristianismo é o que anima Colombo, homem profundamente piedoso (nunca
viaja aos domingos), que justamente por isso considera-se eleito,
encarregado de uma missão divina, e que vê por toda parte a intervenção
divina, seja no movimento das ondas ou no naufrágio de seu barco. (…) A
necessidade de dinheiro e o desejo de impor o verdadeiro Deus não se
excluem. Os dois estão até unidos por uma relação de subordinação: um é
meio, e o outro é fim. (…) Qual um Dom Quixote atrasado de vários
séculos em relação a seu tempo, Colombo queria partir em cruzada e
liberar Jerusalém! (…) Espera encontrar ouro ’em quantidades suficientes
para que os Reis possam, em menos de 3 anos, preparar e empreender a
conquista da Terra Santa.” (p. 13-14)
Pobres dos povos que
estavam no caminho desta sanha imperialista travestida de “missão
divina”! Sabemos que Colombo trombou por engano com o “Novo Mundo”
(depois batizado de América em homenagem a Vespúcio…) quando pensava
estar indo saquear as Índias. Cristóvão Colombo, embevecido com a ideia
de ser um eleito da Providência, destinado por decreto divino a
reconquistar Jerusalém para a Cristandade e fundar o Paraíso terrestre,
não enxerga nos novos continentes somente riquezas a extrair, saciando a
ambição desenfreada dos nobres ibéricos, mas uma chance de ampliar as
sombras que fazem sobre a Terra o símbolo supremo do messias da Cruz.
O ideal de Colombo,
aquilo que o enchia de “orgulho” por uma ação grandiosa e pia, era estar
expandindo a penetração global dos santos Evangelhos, “curando” os
indígenas de suas cegueiras de pagãos, iniciando-os na verdadeira
doutrina e na verdadeira verdade: descem das caravelas os espanhóis, a
serviço dos reis de ultra-mar, com o espírito das Cruzadas medievais
ainda pulsando em seus peitos fanáticos.
Colombo, delirante, quase
tão quixotesco quanto o Dom Quixote de Cervantes, sai atrás das Índias,
pensa estar se dirigindo à Ásia, e acaba trombando… com a América. É
isso que eu chamo de errar feio o caminho, meu chapa. Colombo se
assemelha a alguém que, chegando em Tóquio, perguntasse a um transeunte:
“É aqui o Rio de Janeiro?” Ele aportou nas praias da Jamaica, do Haiti e
de Cuba convictíssimo (e redondamente enganado…) de estar chegando lá
na Conchinchina.
Mas o mais chocante de tudo é que este
Dom Quixote da vida real pôde ser um dos iniciadores de um dos maiores
genocídios da História. Tudo fez em seu arrebatado afã de agradar aos
reis de Castela e de contribuir para a expansão da Cristandade (“Pela
vontade divina, pus deste modo um outro mundo sob a autoridade do Rei e
da Rainha e assim a Espanha, que diziam ser tão pobre, tornou-se o mais
rico dos reinos”, escreve Colombo em novembro de 1500 – pg.
III. EM BUSCA DE OURO E CONVERSÕES…
Mas o que interessa mais aos
conquistadores espanhóis, se são as riquezas ou as “almas a ganhar para a
Cristo”, é difícil decidir: eles parecem igualmente entusiasmados por
roubar o ouro e espalhar a cruz. E uma das coisas mais curiosas e
bizarras da personalidade de Colombo, como diz Todorov, é que ele “age
como se entre as duas ações se estabelecesse um certo equilíbrio: os
espanhóis dão a religião e tomam o ouro” (pg. 62).
Todo o ouro de Ouro Preto, toda a prata
de Potosí, foram-se nas caravelas; e o que ficou da chegada “gloriosa”
do Cristianismo a estas terras foi o massacre indígena e o início da
escravidão neste continente antes intocado por ela. Se Colombo pôde se
tornar um ardoroso defensor da ideologia escravagista, convicto de que
os índios eram seres inferiores em relação aos cristãos europeus, foi
também por este egocentrismo de que o livro de Todorov traz tantos
exemplos. Colombo é a re-encarnação de Narciso, deslumbrado diante do
espelho, embevecido com a ideia da glória, deleitando-se com os aplausos
que imaginava que lhe votavam, nos palácios, o Rei, a Rainha e o Papa,
os cardeais e os nobres…
Distingue os índios do continente entre
os “cristãos em potencial” e os “incuravelmente pagãos”; a estes
últimos, a solução é exterminar. Para os primeiros, bem… ser cristão em
potencial, vocês sabem, não é o mesmo que ser cristão por inteiro… Logo
(raciocínio de toupeira!) “aqueles que ainda não são cristãos só podem
ser escravos” (pg. 64).
Cristóvão Colombo têm, pois, a
“brilhante” ideia que haverá de revolucionar toda a História posterior
da América, da Europa, da África – enfim, do mundo. “Imagina então que
os navios que transportam rebanhos de animais de carga no sentido
Europa-América sejam carregados de escravos no caminho de volta, para
evitar que retornem vazios e enquanto não se acha ouro em quantidade
suficiente…” (idem).
Como excelente linguista que é, Todorov
tem um olhar todo especial para os fenômenos da comunicação humana.
Percebe no interagir entre os homens os defeitos de comunicação, as
incapacidades de ouvir e entender o outro, a dificuldade tremenda de
transpor os abismos da alteridade. Ele aplica estas reflexões sobre a
questão do Outro aos eventos históricos com rara lucidez, realizando uma
vasta pesquisa sobre o material histórico-documental que evidencia os
massacres, as chacinas, os banhos-de-sangue que impuseram os Cortezes e
os Cabrais e os Colombos que invadiram o continente em fins do século
XV.
Lembra-nos, por exemplo, da origem da
palavra “bárbaro” – uma curiosidade etimológica fascinante: os gregos
taxavam de “bárbaros” todos os povos cujo idioma não compreendiam e que
por isso pareciam só falar um incompreensível blá-blá-blá. A
impossibilidade de conhecer realmente a identidade do outro, devido em
parte ao abismo de idiomas radicalmente diferentes, é uma das “condições
necessárias” para que a guerra e o massacre ocorressem. Uma das
sensações que fica da leitura desta obra inquietante de Todorov é um
certo ceticismo obstinado em relação aos que se presumem “eleitos”.
Batalho para tentar ler nas entrelinhas,
em tudo aquilo que Todorov não disse, em toda a imensidão que está
escrita em elipse nesta obra fervilhante, tentando perceber que tipo de
relação humana, de intercâmbio com o outro, seria digno da Humanidade.
Todorov diz, por exemplo, esta verdade simples e tão veraz: “Um diálogo
não é uma somatória de dois monólogos”. Chacrinha tinha razão: “quem não
comunica se estrumbica”. Pior: quem se comunica mal, pode acabar… na
guerra. Conflitos de força bruta podem ocorrer quando a comunicação é
falha, ou quando um dos lados recusa-se a ouvir o outro, ou quando um
arroga-se possuidor da verdade ou “naturalmente superior” e conclui:
“nada tenho o que conversar com essa racinha, com esses selvagens, com
essa ralé, com essa gentinha de estirpe degradada…”
A arrogância, a prepotência, a soberba, o
narcisismo, o egocentrismo: razões para a guerra. As tragédias de
Ésquilo, por exemplo, a todo momento mostram as catástrofes que decorrem
do excesso de orgulho demonstrado pelos homens. A ponto dos gregos
terem em seu panteão politeísta uma certa deusa Nêmesis, responsável por
punir as elefantíases do orgulho humano.
E a religião, em tudo isso? A religião,
como discurso fabricado por homens a fim de que dissessem a si mesmos o
que mais queriam que fosse verdade, tende quase sempre a fazer agrados
ao ego, inflar a vaidade humana, contar contos-de-fada reconfortantes e
otimistas, fabricar genealogias gloriosas onde estaríamos inseridos em
posições de prestígio: você está entre as criaturas “eleitas” pelo
Criador, você é o máximo dos máximos, você é em essência imortal e
inapodrecível, você tem lugar cativo garantido no Paraíso Celestial,
você é o supra-sumo da Criação, a razão pela qual tudo existe; o Sol foi
ali posto para te iluminar e aquecer; os mares e oceanos, para que você
neles nadasse ou os singrasse nos navios; as árvores, para que você as
derrubasse e fizesse casas, móveis e papéis; e os animais, para serem
comida…
Quanto mais o homem se ilude com
doutrinas auto-reconfortantes, agradáveis ao seu narcisismo, mais
fechado se torna ao verdadeiro encontro com o Outro. “A ideia que os
europeus fazem dos índios, segundo a qual estes lhes são inferiores, ou
seja, estão a meio caminho entre os homens e os animais, é a premissa
essencial, sem a qual a destruição não poderia ter ocorrido” (p. 211).
Quanto mais, em sua vaidade, um povo pretende ser o eleito, o maioral, o
predileto dos deuses, mais arreganha os dentes e empunha a espada para
exterminar aqueles que julga os não-eleitos, os idólatras, os que adoram
falsos deuses, os que não crêem nas “verdades sagradas” (“Quem pode
negar que usar pólvora contra os pagãos é oferecer incenso a Nosso
Senhor?”, escreve Oviedo [p. 219], “fonte rica de julgamentos xenófobos e
racistas”).
Quanto mais uma civilização é dominada
por este narcisismo dos povos a que os antropólogos dão o nome de
“etnocentrismo”, mais choques e guerras ocorrem: é sempre antipático
para um povo ouvir seu vizinho dizer: “eu sou o tal, Deus me escolheu,
somos os donos da verdade, temos o direito de imperar sobre o mundo e
espalhar a nossa doutrina…”.
As “raízes psicológicas” que estariam
por trás da imensa tragédia histórica seriam, portanto, esta neurose
comuníssima que consiste em, no encontro entre culturas e pessoas,
julgar sempre que a diferença e a alteridade implica uma relação de
superioridade/inferioridade. Os europeus, egocêntricos e narcísicos,
justificaram todos os horrores que perpetraram com o argumento de que
eles, europeus, eram superiores, já que andavam vestidos, conheciam a
Bíblia e tinham fé no únido deus verdadeiro, enquanto os índios pelados
eram quase animais, certamente sem alma, idolatradores de falsas
divindades, cuja escravização e extermínio agradava ao Papai-do-Céu, que
certamente tem imensa predileção por branquelos ambiciosos famintos por
ouro.
O saldo negativo, não só em milhões de
vidas perdidas, mas em culturas inteiras dizimadas, chega a ser
inimaginável de tão imenso: “os espanhóis queimarão os livros dos
mexicanos para apagar a religião deles; destruirão os monumentos, para
fazer desaparecer qualquer lembrança de uma grandeza antiga….” (p. 83)
(…) “Quando Cortez deve dar sua opinião acerca da escravização dos
índios, encara o problema de um único ponto de vista: o da rentabilidade
do negócio…” (p. 189). Quanto às doenças trazidas pelos europeus, e que
foram uma das causas maiores de mortes massivas de índios, os espanhóis
assim pensavam: “por que combater uma doença, se ela foi enviada por
Deus para punir os descrentes?” Revoltante!
Todorov, pensador audaz que não se intimida diante do horror (seu livro sobre os campos de concentração, Em Face do Extremo, é outro excelente estudo sobre as raízes do Mal…), escreveu em A Conquista da América
uma obra acabrunhante, assustadora, que revela os sórdidos submundos da
História Real deste que foi, talvez, o maior genocídio de que se tem
notícia no caminhar de nossa espécie:
“Lembraremos que em 1500 a população do
globo deve ser da ordem de 400 milhões, dos quais 80 milhões habitam as
Américas. (…) Se a palavra genocídio foi alguma vez aplicada com
precisão a um caso, então é esse. É um recorde, parece-me, não somente
em termos relativos (uma destruição da ordem de 90% ou mais), mas também
absolutos, já que estamos falando de uma diminuição da população
[nativa] estimada em 70 milhões de seres humanos. Nenhum dos grandes
massacres do século XX pode comparar-se a esta hecatombe.” (p. 192)
Destes horrores repelentes e chocantes,
fica somente a aspiração por um outro mundo possível (“um pouco de
possível, ou então sufoco!”) onde haja convivência e coexistência da
diferença, pleno respeito à alteridade, diálogo fecundo e aberto com o
Outro, sem que jamais o fato da diversidade degenere em presunções de
superioridade/inferioridade. Em prol, enfim, do júbilo de ser impuro, da
alegria expansiva do diálogo mutuamente iluminador, de um
cosmopolitismo que nos enxergue não como cindidos em etnias e
nacionalidades, mas como passageiros do mesmo barco, conviventes no
mesmo planeta rodopiante que viaja pela galáxia…
(por Eduardo Carli de Moraes
Mestrando em Filosofia/UFG
Goiânia, Setembro de 2012)
Mestrando em Filosofia/UFG
Goiânia, Setembro de 2012)
Fonte: https://acasadevidro.com/2012/09/25/a-america-nao-foi-descoberta-a-invasao-europeia-do-novo-mundo-segundo-todorov/
Leia o texto acima e responda:
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B- Em "COMENTAR COMO", escolha a opção ANÔNIMO.
C- Responda na ordem que desejar e só clique em PUBLICAR quando tiver respondida todas as questões.
1- Podemos interpretar a chegada dos espanhóis em 1492 apenas como a "Descoberta da América"? Explique.
2- "O encontro entre índio e europeus foi, desde o começo, pacífico. Foi um contato de estranhamento, mas positivo para as duas partes. Aos índios e europeus foi somada também a presença dos povos africanos, que também ocorreu de modo positivo". Esta afirmação pode ser encarada como verdadeira? Explique sua posição.
3- Fale sobre as intenções e práticas dos conquistadores, abordando as intenções de Colombo e o saldo em mortes.
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